terça-feira, 23 de outubro de 2012

PARA O QUE FOMOS FEITOS?



PARA O QUE FOMOS FEITOS?
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Poema de Natal (Vinícius de Moraes)

Hoje ele faria 99 anos.
Apelidado de poetinha carinhosamente por Tom Jobim, Vinícius de Moraes produziu diversas obras passando pela música, pelo teatro, pela literatura e também pelo cinema. E para o que Vinícius foi feito? Nascido em 1913 foi diplomata e jornalista, foi compositor e poeta... E POETA...
Era, como costumava dizer, "um labirinto em busca de uma saída".
Assim é a poesia, um encontro com o lado escuro e um momento em que pode também estar suspenso na alegria, deleitar-se com o amor. Precisamos lidar com tantos lados em nós, tantas negações, tantos desenganos, escuridões... Não se pode chegar a eles de barco, mas apenas mergulhando fundo. A poesia é a linguagem feita de outras linguagens, é a linguagem necessária que traduz para nós o que as outras linguagens não conseguem. Também somos feitos de poesia e não podemos negá-la em nosso cotidiano. Precisamos dela, precisamos desse mergulho, desse descanso.
O formato da poesia descansa nossos olhos, cansados de tanta prosa, do formato retangular dos textos... A poesia brinca, ousa, se deixa ver em parte e depois se esconde para que exercitemos a busca por mais, por um outro olhar que não sempre o racional. Na poesia as palavras podem ser outras, posso dizer que pente é borboleta, que riso é bolha de sabão, que a tristeza é um sono oceânico em que dormitamos...
A poesia é um caminho em que podemos descontruir a palavra e o seu significado, repensar para que ela foi feita e brincar de alquimista, misturar, experimentar e entender, às vezes, apenas a sonoridade, o agradável... Ou se pode afiar a palavra e ferir, abrir, deixar à mostra... a poesia não bate de frente, ela tem seus caminhos... e o entendimento que temos dela nos pega de surpresa e para cada um ela é de um jeito.
E para quem escreve? Sempre usamos as palavras para coisas certas, definidas, padronizadas... Mas porque às vezes não sai em forma de fala ou de texto? Porque às vezes o que precisamos só sai em poesia?
Porque a poesia deixa nua a palavra. Agora ela pode servir para outras coisas com as quais são estávamos acostumados. A não-lógica da poesia nos obriga a aguçar novos sentidos, a olhar onde não olhamos, a entrar onde não queremos, a saber que nem tudo sabíamos... ela nos provoca, de mansinho, e nos tira do lugar...
A poesia é a eterna inovação da palavra.
“Algumas palavras me fizeram cócegas hoje cedo. À tarde viraram poesia...”

Para curtir mais sobre esse grande poeta, conheça suas músicas, neste link estão disponíveis mais de 300 de suas composições: http://letras.mus.br/vinicius-de-moraes/
Veja também o documentário completo “Vinícius de Moraes”, de 2005.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O InovarEduca agradece a sua visita, participe sempre! :)

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...