segunda-feira, 11 de março de 2013

UMA CULTURA DE ESPECTROS ANÔNIMOS E VIGILÂNCIA DISTRIBUÍDA



Controle? Vigilância digital? O que é público e o que é privado hoje?
Em uma era em que todos podem publicar – tornar público – tudo o que quiserem e em que é muito fácil ‘vigiar’ a vida dos outros onde estão as linhas limítrofes do público e do privado?
Você conhece o site 4Chan? Criado em 2003, esse é um site descentralizado para compartilhamento anônimo de uma variedade de assuntos, dentre eles, imagens, músicas, vídeo-games, animes, mangás, vídeos, textos, fotografia, e fóruns de discussão, totalizando mais de 40 canais de temas diferentes, não sendo necessário nem mesmo o registro de uma conta. E o que ele tem de especial afinal? Bem, o que era pra ser apenas um site comum para compartilhamento de mídias acabou virando um imenso espaço completamente livre e confuso em que é possível encontrar de tudo, desde conteúdo ilegal, notícias mentirosas, pornografia e até um point de hackers. A famosa comunidade Anonymous surgiu em um dos fóruns do 4Chan, assim como os famosos memes e lolcats.
Há quem chame esse site de rede antissocial. Lembrando que não é preciso se registrar, ou seja, você poderá se comunicar com as outras pessoas sem nem mesmo se identificar. No entanto, é claro que lá também estão pessoas que usam a rede para fins menos caóticos.
Para saber mais sobre o site 4Chan, clique aqui.
A doutora em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Fernanda Bruno, em seu texto “Estética do Flagrante: Controle e prazer nos dispositivos de vigilância contemporâneos” nos fala sobre um grande circo onde tudo vira espetáculo, onde todos podem postar o que quiser, “em que as relações sociais se tecem atreladas a uma mistura de voyeurismo, exibicionismo e vigilância”. Essa parece ser a cultura natural da vida urbana: um controle sobre tudo, mas ao mesmo tempo uma necessidade de expor tudo, de tornar tudo visível para que os outros possam ver, e assim o controle é cedido. O que é público e o que é privado nessa nova cultura?
O site 4Chan é palco de acontecimentos bizarros ou no mínimo surpreendentes, como, por exemplo, invasões em contas de e-mails, provocações políticas, encontram pessoas desaparecidas, “capturam” malfeitores que machucam ou matam animais indefesos, criam boatos contra celebridades por pura diversão, para confundir as pessoas, para testar a capacidade de influência e pânico de uma notícia qualquer, espalham vírus, pornografia e movimentos anônimos. “É tudo pelo simples prazer de zoar, resume um usuário brasileiro, que prefere ser chamado de anão (a palavra anonymous abreviada para “anon”, que no Brasil ganhou a tradução marota "anão"), que diz ter participado de um trote que espalhou a notícia falsa da morte do baixista da banda Fresno, Rodrigo Tavares, em 2009. O objetivo é ser escroto, resume”.  A pergunta é por que não? Nesse novo mundo fluido onde as referências se perderam ou se multiplicaram, sem credibilidade, são infinitas as possibilidades e os meios. No entanto, qual o objetivo de entrar no 4chan e publicar algo?
“Não surpreende que não mais se escrevam distopias nestes tempos: o mundo pós-fordista,moderno fluido, dos indivíduos que escolhem em liberdade, não mais se ocupa do sinistro Grande Irmão, que puniria os que saíssem da linha. (...) O controle está distribuído, “quando as autoridades são muitas, tendem a cancelar-se mutuamente”. Esse comentário do sociólogo polonês Zygmunt Bauman reflete a falta do controle ou uma tentativa frustrada de controlar uma intensa atividade midiática que se perde na imensidão da web. Todo esse conteúdo “publicado” na web em geral, e em especial no 4chan, vai sendo legitimado sobre questões privadas e atitudes que a maioria das pessoas não teria se não fosse por meio da proteção conveniente que a internet oferece. Você pode criar um perfil, colocar qualquer foto e então pode denunciar políticos, acessar pornografia e viver fetiches, sempre referendados por comunidades que compartilhar os mesmos interesses.
Bauman ainda reflete que “O que quer que seja nomeado, inclusive os sentimentos mais secretos, pessoais e íntimos, só o é propriamente se os nomes escolhidos forem de domínio público, se pertencerem a uma linguagem compartilhada e pública e forem compreendidos pelas pessoas que se comunicam nessa linguagem”. A tendência atual é que a esfera pública seja colonizada por questões que antes eram classificadas como inadequadas à exposição pública. Quem está tomando conta? Todos estão. Mas quem de nós tem o poder de controlar tudo e garantir apenas um fluxo coerente que siga os padrões morais? Parece que os padrões morais mudam conforme a conveniência.
Protegidos por nossos próprios espectros mais convenientes, podemos tornar público tudo aquilo que desejarmos, mas para isso é preciso que o “contrato” seja assinado por todas as partes, todos precisam entrar no jogo, e expor a própria vida para que a coisa possa fluir e não ser constrangedor apenas para alguns. E assim também se adquire o direito de exigir a exposição pública da intimidade de celebridades e anônimos, e se isso não bastar então se podem criar boatos para divertir e agitar um pouco a rotina. Tudo parece perdoado já que todos estão fazendo. Escravos do imediatismo do querer: uma busca frenética em tirar a espera da vontade, como nos diz Bauman.
Por trás de cada publicação e interação está um espectro cada vez mais autônomo, e que, segundo Marc Guillaume, funciona como uma projeção de si em que o individualismo torna-se exacerbado e em efeito cascata, as pessoas agem como se cada vez mais, fosse desinteressante transferir os problemas da esfera privada para a pública. Sentem-se responsáveis por resolver tudo sozinhos.
Mas o que a era digital tem de especial? É justamente o não individualismo e sim o trabalho em coletivo. A cooperação é superior à competição e as tecnologias permitem cooperar em larga escala. (Manuel Castells). Em uma entrevista com o sociólogo espanhol Manuel Castells foram discutidos temas como a cooperação, a web 2.0, a educação, economia e política na sociedade da informação. O que move a internet e a comunicação móvel são os velhos princípios da cooperação, com grande escala, grande velocidade, com grande volume informacional tratado ao mesmo tempo. Em uma entrevista Castells aprofundou as questões das transformações sociais causadas pela internet:
A internet e as novas transformações sociais
Não podemos prever o futuro, mas podemos perceber o que já está acontecendo. Todos os espaços de fóruns para discussão, espaços políticos, espaços de relação social, de informação, espaços comerciais, tudo isso devido às tecnologias móveis está se difundindo no conjunto da sociedade e no conjunto de tudo o que fazemos. Vivemos no Eu++, ou seja nós “mais” toda a nossa rede de conexões, levamos essa rede conosco, estamos conectados, comunicados e isso muda nossa forma de aprender, de trabalhar, de diversão, de assistir TV, e obviamente a comunicação.
Isso não quer dizer que somente por ter a possibilidade tecnológica que estejamos utilizando-a de forma correta. Isso depende da capacidade cultural e educativa das pessoas e também das organizações que são capazes de adaptar-se a essas mudanças, como por exemplo as escolas. Os alunos utilizam suas tecnologias móveis fora da escola ao invés de haver uma integração e uma articulação desses espaços e recursos. A escola precisa abraçar as mudanças e não repeli-las. Vivemos em um mundo de extraordinária capacidade comunicativa e no entanto as organizações estão muito atrás do que poderiam fazer.
Leia mais, aqui.



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